domingo, 24 de agosto de 2008

Quem tem medo de escuro?

Por Paulo Azevedo Jr.

Bicho-papão, lobisomem, altura e granada. Fuzil, avião, escuro e seqüestro. As coisas como eram, e as coisas como são. Os velhos, os jovens e as crianças. Não leitor, não enlouqueci. Espero que em breve tudo isso faça sentido.

Estava almoçando em uma lanchonete na zona sul do Rio, quando comecei a ouvir a conversa de uma turma de senhores que estava na mesa ao lado. Com aquele típico sotaque carioca, cheio de "esses" que parecem xis, e "erres" carregados, eles falavam sobre os medos de antigamente e os de agora.

Aos poucos aquele papo despretensioso começou a chamar minha atenção e quando vi já estava quase me metendo na conversa deles. Meus amigos falavam sobre alguma coisa que tinha ocorrido na noite anterior, mas no momento o que me interessava era a conversa dos velhos. Medo era o assunto deles.

  • Quando eu era criança, a gente tinha medo de altura, de escuro, de bicho-papão. Hoje em dia, a meninada tem medo de granada, de fuzil, de metralhadora. Nesses quarenta anos a vida mudou muito, e pra pior, eu acho.

  • É verdade, outro dia meu netinho contou que o colega dele não queria ir para a aula porque o primo tinha sido seqüestrado e ele estava com medo de também ser.

Fiquei pensando sobre aquilo. Não que eu seja uma pessoa medrosa, mas também estou longe de ser um valentão. Claro que na infância eu tinha meus medos, alguns frutos da minha imaginação, outros da realidade que me cercava. Em algumas peças da casa, eu simplesmente não ia durante a noite. O motivo não sei, mas só Deus sabe o quanto a despensa e a lavanderia, que ficavam tão longe do meu quarto, me assustavam. Era como se fosse um universo paralelo, um mundo de trevas e perigos iminentes. Estrada também era uma coisa que me deixava tenso, mas isso tinha lá seus motivos. Em outra crônica explico isso melhor.

Hoje em dia essas fobias passaram. No lugar delas vieram outras, mas com as quais eu tenho de lidar, pois, de outro modo, não sairia mais de casa. Aos poucos, coisas como assaltos, atropelamentos e seqüestros passam a ser tão rotineiras que deixam de nos chocar. Não que isso seja bom, mas é a realidade, e como meu espírito não é panfletário, e nem tampouco revolucionário, acabo me conformando com o mundo que me cerca.

Mas voltando ao papo dos velhos, achei o ponto deles interessante. Antigamente, os medos dos pequenos e dos adultos eram diferentes. Enquanto os primeiros eram fruto da imaginação infantil e do folclore popular, os segundos vinham da vida cotidiana. Atualmente, os temores não têm mais idade. Parece que no mundo moderno criança e adulto estão à mercê dos mesmos medos. Daqui a pouco, o pai vai pedir para dormir com o filho à noite.

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