domingo, 24 de agosto de 2008

Quem de tudo um pouco sabe, de nada sabe muito

Por Jacqueline Pasini

Salas de aula de colégio são sempre parecidas. As figuras se repetem. Vai dizer?! Durante todos meus anos de escola os colegas mudaram. Não foram sempre os mesmos, mas os tipos se repetiam. E imagino que deva ter sido assim com todo o mundo. Naquelas conversas nostálgicas, entre amigos, a gente sempre acaba relembrando e contando causos de infância que aconteceram, memorando as nossas peripécias e as dos coleguinhas.

Quem nunca teve aquele colega inconveniente, dedo-duro, puxa-saco, pra não dizer outra coisa, que no dia de prova decisiva, aquela que tu precisa tirar uma nota alta pra não repetir o ano (e não levar uma surra quando chegar em casa), te delatou pra professora, dizendo: "Sôra, o fulaninho tá colaaaando!". Se não aconteceu contigo, outro deve ter sofrido essa ou alguma parecida. Ou então aqueles que eram verdadeiros pentelhos, bagunceiros, infernais. O tipo que todo professor reza para não existir. Fazem piadinhas com o mestre, atiram bolinhas de papel nas meninas mimadinhas. Levantam da cadeira para ir trovar com o cara que está no outro canto da sala. Quando não começam a brigar, de se agarrar no couro com outro colega. Esses sempre existem, não é? E têm os trovadores, que passam a aula inteira comentando uma coisa com um ou outro, os tímidos, os envergonhados... Mas os mais queridos pelos profes são os CDFs. Acho que não preciso explicar o significado da sigla, todo mundo entende o que quero dizer.

Eu era um tipo CDF alternativo. Pode isso, acho eu. É que eu não era da tribo dos que se exclui e fica isolado dos outros, reunido apenas com os semelhantes. Eu era enturmada. A reclamação que meus pais ouviam, no fim de cada bimestre, era de que eu conversava demais em aula. "Tua filha é ótima aluna! É só ler o boletim dela! Notas altíssimas, mas ela atrapalha os coleguinhas, desconcentra eles". Eu era uma falsa nerd. A solução encontrada pelos coordenadores era me fazer ajudar os colegas nas suas dificuldades. Hoje tu ajuda o fulaninho no tema de física, amanhã ajuda a ciclana pra prova de português, e se tu quiseres, também tem o beltrano que tá quase rodado em biologia. E eu não me importava de ajudar, simplesmente porque gostava de estudar.

O problema veio depois. Depois que terminei o colégio. Agora segue meu desabafo. As pessoas costumam ter aptidões para determinadas áreas do conhecimento, e isso eu percebia no colégio. Eu como sempre, me dava bem em todas, não me destacava em nada específicamente. Aí chega o momento de tu crescer, virar adulto, arrumar alguma coisa para fazer pro resto da tua vida. Algo que tu goste e saiba fazer. Eu gostava de estudar, de ter conhecimento, de enfiar a cara nos livros, só que não tinha nenhum gosto em especial. Decidi que queria ser jornalista. Talvez por ser comunicativa desde criança, talvez por ter um dia acreditado que fazer jornalismo é ter muito conhecimento. E na verdade é, deveria ser.

Mas a minha saciedade pelo estudo não se satisfez. Para ser boa na minha profissão tenho de saber um pouco de tudo. Afinal, o jornalista na essência do iluminismo sob o qual surgiu a profissão, deve ser um intelectual. Mas qual o mérito de ser um? Pergunte qualquer coisa a algum e ele te fará um grande discurso, com palavras difíceis, cheio de opiniões. Tu fica admirado pela amplitude na abordagem de assuntos, e tu pode conversar qualquer coisa com essa pessoa. Mas resolve perguntar algo específico. Algo a fundo sobre anatomia. Provavelmente a conversa fique rasa.

E é assim que me sinto. Sedenta. Sabendo de tudo um pouco, mas nada de alguma coisa. Eu me tinha por satisfeita por conseguir dominar vários assuntos. Naquele contexto, até que era positivo. Eu era uma aluna completa. Mas hoje vejo que teria sido bom se tivesse mostrado aptidão por algo. Me sinto às vezes sem talento e uma falsa intelectual. O dia que eu tiver um filho e ele estiver no colégio não vou me preocupar se ele é ruim em alguma coisa e bom em outras.

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